9.6.11

Dez anos por um consumo mais sustentavel

Por Vinicius Neder

O Instituto Akatu completa em 2011 dez anos de atuação em prol da mobilização pelo consumo consciente. Ao longo da primeira década de vida, a entidade calcula que suas campanhas e ações já atingiram 60 milhões de brasileiros, “conscientizados ou mobilizados, com maior ou menor intensidade”.
Ainda neste semestre, o Akatu lançará uma campanha nacional de comunicação para celebrar o aniversário e, principalmente, propor uma agenda de trabalho para a próxima década. “É importante olhar para aquilo que foi feito, mas temos que olhar para frente, para os desafios que a gente tem, que são muitos”, afirma o diretor-executivo do Akatu, Eduardo Schubert, na entrevista abaixo.

O Instituto Akatu completa 10 anos em 2011. O que mudou em termos de consumo consciente no Brasil nesse período?
Eduardo Schubert – Mudou muita coisa. Há dez anos, a expressão consumo consciente sequer existia, o tema não era debatido. Hoje, isso está absolutamente comum: se debate, se conversa, outras entidades incorporaram isso nas suas ações, as empresas começaram a se envolver com o tema e o consumidor, gradativamente, vem aprendendo a praticar isso no dia a dia. A grande diferença é esta: saímos de uma situação em que o tema não era debatido, não estava na agenda, e hoje, certamente, ele está.

É possível medir o aprendizado do consumidor?
Eduardo – Existem vários indicativos de que isso tem avançado na agenda. Há desde indicativos mais midiáticos a coisas mais científicas. Por exemplo, a questão das sacolas plásticas nos supermercados não era sequer debatida há dez anos. Hoje, há um crescente número de consumidores espontaneamente trocando as sacolas plásticas dos supermercados por caixas de papelão e outras alternativas. Obviamente, tem havido campanhas de propaganda. Inclusive o Akatu esteve envolvido na campanha “Saco é um saco”, patrocinada pelo Ministério do Meio Ambiente. Em seguida, cadeias de supermercado adotaram a campanha e, mais recentemente, alguns municípios estão legislando nesse sentido. Mas o consumidor avançou muito nessa agenda. Além disso, toda a questão de reciclagem avançou muito. Então, há elementos do dia a dia que falam mais do que estatísticas.

Passada a inclusão na agenda, qual a melhor forma de traduzir a ideia de consumo consciente para a prática do consumidor?
Eduardo – O ato de consumo no ponto de venda equivale a um voto. Assim como, do ponto de vista social e político, o voto emite opinião sobre determinados assuntos ou candidatos, há uma força muito grande quando, no ponto de venda, escolhem-se a marca A ou a marca B ou deixa-se de consumir alguma coisa. Pode-se questionar: “individualmente, quem sou eu?” Mas é da somatória de pequenos atos individuais que vem a fortaleza desse movimento. Seja porque pequenos atos são repetidos cotidianamente durante a vida útil de um consumidor, seja porque o ato individual, pequeno, passa a ser muito grande no coletivo. E depois, quando alguém demonstra seu ato, outro se inspira e acaba reproduzindo.

Como o consumo consciente pode ser disseminado?
Eduardo – A educação é fundamental. Temos feito ao longo desse tempo todo muito trabalho de educação, com a criança, com o jovem, procurando formar uma nova geração de consumidores com consciência crítica em relação ao consumo. Quando a gente discute o que está por trás do consumo consciente, em hipótese nenhuma é o não consumo. É sim consumir de forma diferente. Sair do físico para o virtual, do desperdício para a reciclagem, da posse exclusiva para a posse compartilhada. É uma série de atitudes que transformam a maneira de consumir, continuam satisfazendo as necessidades, mas com impacto muito menor no planeta. Trata-se de adequar o consumo dos indivíduos à capacidade que o planeta tem de prover recursos naturais que são finitos, gerando resíduos que possam, por sua vez, ser absorvidos pelo planeta.

O fato de o Brasil ter indicadores ruins em educação aumenta o desafio?
Eduardo – Sem dúvida, é um desafio enorme. Temos diante de nós uma tarefa bastante ambiciosa, seja porque estamos mexendo com coisas que são centrais na vida das pessoas, seja por causa desse ponto da educação. A questão da base educacional, não só aqui, mas em outros países também, faz uma diferença muito grande.

Pesquisa sobre percepção do consumidor, lançada em 2010.

Isso é importante para não deixar a prática do consumo consciente restrita a uma elite?
Eduardo – Sem dúvida. A elite, por definição, é uma pequena parcela. Pode ser formadora de opinião, mas é uma pequena parcela. Hoje, no Brasil, na China, na Índia, ocorre a incorporação de contingentes enormes no mercado de consumo. Essas pessoas chegam buscando uma satisfação de carências acumuladas durante gerações, sem grande preocupação com essa questão. E isso precisa ser enfrentado. Hoje, no mundo, já se consome 50% mais do que a Terra tem capacidade de regenerar. Estamos consumindo um planeta e meio. Mas é preciso considerar que somente 25% da população mundial consome acima das suas necessidades básicas. Veja como essa conta é terrível: incluir mais gente num padrão mínimo de consumo tem um impacto terrível no planeta. Trata-se realmente de buscar outra forma de consumo, que privilegie o compartilhamento ou outras estratégias, porque no atual modelo a equação não fecha.

Como lidar com essa incorporação de contingentes populacionais no mercado de consumo?
Eduardo – O desafio é maior. São pessoas que acabaram de ingressar no mercado de consumo, trazem carências acumuladas e querem descontar o tempo perdido. A tarefa é de comunicação e de educação. O segundo aspecto, a educação, é uma ação de mais longo prazo e toma tempo. Você pode até mais rapidamente fazer com que as pessoas reconheçam a existência do problema, racionalmente. Mas, na hora do comportamento, é mais difícil fazer com que elas mudem. Então, toda a ação do Akatu está mais voltada para mobilizar contingentes maiores, usando pedagogias e formas que facilitem essa compreensão no cotidiano. É preciso tirar essa problemática do cérebro, do racional, e trazê-la para o coração, para o sentimento.

Há níveis distintos de atuação, de acordo com o público-alvo?
Eduardo – Claro, é preciso adequar toda a comunicação nas ações. Inclusive, regionalmente isso faz diferença. O Brasil tem diferenças regionais importantes.

A Conferência Rio+20 é uma oportunidade para fortalecer o consumo consciente na agenda global?
Eduardo – A questão do consumo consciente está central. Ela já foi central nos debates do Fórum Econômico Mundial, em Davos, este ano. Muito se tem falado, há mais tempo, da produção sustentável, no lado da oferta. Hoje, se fala também da demanda. Não há como você ter um lado se não tiver o outro. Oferta e demanda andam juntas. Então, nas proposições e nas discussões prévias para a Rio+20, a questão do consumo consciente é central. O papel das empresas e do governo como educadores para esse novo tipo de consumo é fundamental.

Que ações marcarão os dez anos do Instituo Akatu?
Eduardo – Vamos lançar uma campanha celebrando os dez anos e, principalmente, renovando o nosso desafio para os próximos dez anos. É importante olhar para aquilo que foi feito, mas temos que olhar para frente, para os desafios que a gente tem, que são muitos, e propor uma nova agenda de trabalho para a próxima década.

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