por Timóteo Carriker
“Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu seu Filho unigênito...” João 3.16 Imagino que haja muitas objeções a este raciocínio. A primeira se baseia em 1 João 2.15: “Não ameis o mundo nem as coisas que há no mundo. Se alguém amar o mundo, o amor do Pai não está nele”. A solução é fácil. Apesar de os dois textos usarem a mesma palavra, “kosmos” (mundo), em João 3.16 ela se refere ao mundo físico ou humano, enquanto em 1 João 2.15 se refere aos valores negativos de um “mundo” pecaminoso. Voltando à pergunta do título, se Deus amou o mundo a ponto de dar seu único Filho, qual é a medida do nosso amor pelo mundo? Surge então a segunda objeção: Será que João não está se referindo ao mundo de pessoas em vez de se referir ao mundo físico?
Ele está falando do mundo de pessoas sim. Aqui, “mundo” claramente se refere aos dois aspectos do mundo criado por Deus: humano e não-humano. Basta ler João 1.9-10. Talvez a conexão entre os dois fique mais clara se considerarmos Romanos 8.18-25, em que a salvação da humanidade e do mundo não-humanos é interligada.
Toda a criação um dia será “salva”, isto é, renovada e recuperada. Porém, de acordo com Romanos 8, esta redenção da criação só acontece depois da salvação dos seguidores de Cristo. E o motivo é que, embora a redenção venha sempre e unicamente de Deus, ele próprio incumbe o seu povo de ser instrumento para anunciar tal redenção. Por isso, o povo de Deus, a igreja, tem um papel importantíssimo na redenção da criação. Certamente, entre outras coisas, isso implica num compromisso ativo que os ecologistas chamam de “conservação”. A palavra preferida das Escrituras parece ser “redenção” ou “renovação”. Basicamente, o que Paulo descreve em Romanos 8 é o que o visionário João fala em Apocalipse quando descreve o novo céu e a nova terra.
Agora talvez já tenha surgido uma terceira objeção à ideia de “amarmos este mundo como Deus amou”.
Afinal, a Bíblia não afirma que este mundo físico, antes do fim dos tempos, se desfará? Então, por que tanto esforço para conservá-lo? Será que a Bíblia ensina que o mundo físico que conhecemos um dia não mais existirá? Vejamos 1 Pedro 3.7 e 12. Ambos os versículos falam da “destruição” por meio do “fogo”, tanto na maioria das nossas traduções quanto no original. Lendo esses versículos isoladamente e fora do seu contexto, só podemos concluir que o mundo físico aguarda, de fato, uma destruição futura total, uma aniquilação e o desaparecimento, assim como o fogo transforma a madeira em cinzas. Porém, o versículo 6 muda esta leitura. Os céus e a terra, isto é, o mundo físico, serão destruídos, consumidos pelo fogo, “da mesma forma” que o mundo físico anteriormente foi destruído pelas águas. Que tipo de “destruição” é essa? Por um lado, tal destruição certamente não é aniquilação, obliteração, e extinção total. Pois, depois do dilúvio, o mundo continuou a existir. Porém, tal destruição não ocorreu sem dor e sem estrago substancial. Portanto, a destruição do dilúvio e do mundo futuro “envolve grande dano, mas não a inexistência”. Outros usos desta linguagem nas escrituras apontam para a ideia de purificação e transformação, um processo doloroso e abrangente (Ml 3.1-4; 1Co 3.12-15).
Isto significa que “novos céus” e “nova terra” não são “outros céus” e “outra terra”, mas céus e terra renovados, da mesma forma que Cristo nos transforma em novos homens e novas mulheres, isto é, não fisicamente em outras pessoas, mas em pessoas renovadas, e assim, em outras pessoas interiormente.
Isto significa que “novos céus” e “nova terra” não são “outros céus” e “outra terra”, mas céus e terra renovados, da mesma forma que Cristo nos transforma em novos homens e novas mulheres, isto é, não fisicamente em outras pessoas, mas em pessoas renovadas, e assim, em outras pessoas interiormente.
Voltamos à pergunta inicial: Quanto nós amamos este mundo? Quanto amamos a criação de Deus, que ele próprio pretende renovar? Qual é a nossa ação atual de manifestação deste amor?
Fonte: Revista Ultimato de novembro-dezembro de 2009.
• Timóteo Carriker é teólogo, missionário da Igreja Presbiteriana Independente, capelão d’A Rocha Brasil e surfista nas horas vagas. É autor de A Visão Missionária na Bíblia e coordena diversos sites (acesse www.tim.carriker.com).
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